SARAH AFFONSO
ARTE DE TRANSMITIR ESSA «COISA SÉRIA QUE É A ALEGRIA»


pessoa



Figura das mais representativas da primeira geração dos modernistas portugueses, Sarah Affonso legou-nos a poética do maravilhoso, da cor e luz, da naturalidade. Para as telas transportou aldeias, romarias, procissões, anjos da Terra e do Céu, tradições, uma cultura popular ímpar. E transmitiu-nos, como ninguém, essa «coisa séria que é a alegria». No momento em que se completam trinta anos sobre a morte de Sarah Affonso evocamos a artista e também o seu companheiro de vida, Almada Negreiros.





TAMBÉM NESTE SÍTIO
CRÓNICA DA ESCRITORA ROSA ALICE BRANCO
SOBRE «A MINHA SARAH AFFONSO»



DEZEMBRO DE 2013








THEATRO POLYTHEAMA
LUZES E SOMBRAS DE UMA HISTÓRIA CENTENÁRIA

Evocamos a vida atribulada do Teatro Politeama ao longo dos cem anos que se completam agora. Recordamos também uma antiga conversa com o grande ator Varela Silva que muito lamentava não se ter feito uma pequena Broadway naquele espaço lisboeta das Portas de Santo Antão. E não poderíamos esquecer as imagens pungentes de um teatro excelso convertido em cinema de "coboiadas".



DEZEMBRO DE 2013







FIDALGO PEDROSA
"OBSERVADOS": FOTOGRAFIAS À ESPERA DE OBSERVADORES

Todos somos observados. Todos somos observadores. E a observação desta realidade aparentemente singela reveste-se de complexidade interpretativa quando incorporamos entre o observado e o observador um elemento nada acidental, nada inocente: a câmara fotográfica. O observador intrusivo, quanto possível discreto, é o fotógrafo, cujo olhar, uma vez reproduzido, pode ser observado por todos nós, em qualquer tempo e em qualquer lugar. Tornamo-nos, também, observadores intrusivos dos observados. Sabe-se que este é um muito antigo tema foto-ensaístico, porém sempre atual e aliciante. Em situações limite o fotógrafo pode, até, tropeçar na jurisprudência aplicável. Fidalgo Pedrosa assumiu o desafio e conferiu-lhe a amplitude incomum de uma exposição integrando 25 fotografias a preto e branco, à qual deu precisamente o título "Observados".
Inauguração no próximo domingo, dia 8, às 17h00, no Alfam’art (Rua do Cais de Santarém, 30, Lisboa). A exposição estará patente até 8 de janeiro, todos os dias. Para descanso dos "observados" encerra às quintas-feiras. PF


TAMBÉM NESTE SÍTIO
CRÓNICA DE PEDRO FOYOS
SOBRE O LIVRO "A VIDA NUM INSTANTE"
DE FIDALGO PEDROSA



DEZEMBRO DE 2013






PRÉMIO NAVE ESPECIAL 2013

TERESA CORTEZ E WOLF SCHMID VENCEM COM PROJETO "GUARDA-SÓIS DO BRASIL"




Teresa Cortez e Wolf Schmid são os vencedores da 1ª edição do Prémio Nave Especial com o projeto Guarda-sóis do Brasil, na categoria História Digital Ilustrada Infantil.
O Prémio Nave Especial consiste no desenvolvimento pelas empresas organizadoras (Pato Lógico e Biodroid) de uma aplicação com base na proposta vencedora e no pagamento de 1500 euros como adiantamento de direitos de autor pela comercialização da mesma em plataformas digitais.
O júri, constituído por André Letria (Pato Lógico), Tiago Ribeiro (Biodroid), Jorge Silva (Silva Designers), Paulo Ferreira (Booktailors) e Pedro Campos (SPA), decidiu ainda atribuir na mesma categoria quatro menções honrosas aos projetos Chef Pickle, de Filipa Areias e Margarida Madeira, A Vida às Vezes Dói, de Rita Almeida e Rita Ferreira; Shoe Mice, de Miguel Alves, Joy Hanford e Humberto Neves; e Things Keep Falling Out Of My Head, de Rita Sá.
O prémio da categoria História Digital Ilustrada não foi atribuído.
As considerações do júri sobre os trabalhos vencedores podem ser consultadas no site da Nave Especial.


TERESA CORTEZ
Nasceu em 1981, em Lisboa. Licenciou-se em Pintura e realizou o mestrado em Arte Multimédia na Faculdade de Belas Artes de Lisboa. Trabalha como ilustradora desde 2003, para discos, revistas e capas. Ilustrou o livro para a infância O Lobo das Meias, com a editora Tcharan em 2012. Foi selecionada para a exposição internacional de ilustradores em Bolonha em 2011 e para o "Picture Book Show" da revista norte-americana 3×3 em 2013. Trabalha em animação desde 2006. O vídeo clip A pele que há em mim, de Márcia, foi selecionado para o "Prémio Jovem Cineasta Português" no Cinanima 2010 e ganhou o prémio "Melhor Curtíssima Portuguesa" na Monstra — Festival de Animação de Lisboa 2011.

WOLF SCHMID
Nasceu em 1976, na Alemanha. Estudou retórica e etnologia em Tübingen e Hamburg. Trabalhou em livrarias, numa editora e como "bike-messenger" em Frankfurt, Hamburg e München. Vive em Portugal desde 2009, trabalha como jornalista editorial, tradutor e escritor. Foi selecionado para o prémio "fm4 Wortlaut 2011" e "fm4 Wortlaut 2013". Publicou textos em antologias e em catálogos dos artistas Sebastian Stumpf (Leipzig) e Rui Telmo Romão (Lisboa).

DEZEMBRO DE 2013








NOVO PROJETO DO f2.8 COLECTIVO DE FOTOGRAFIA
"AS CIDADES VISÍVEIS (TORNAR VISÍVEIS AS CIDADES INVISÍVEIS)"





Após o êxito de uma exposição sobre o trabalho mineiro apresentada recentemente no Museu de Arte Popular, em Lisboa, o grupo de autores constituído sob a denominação f2.8 Colectivo de Fotografia revela um novo e criativo projeto subordinado ao tema “As Cidades Visíveis (Tornar visíveis as cidades invisíveis)”. A exposição, patente no Espaço Sousa Valles (Rua Gonçalo Zarco, 2-A, em Lisboa) será inaugurada no dia 4 de dezembro, às 19h00, podendo ser visitada de segunda a sexta-feira, das 10h00 às 14h00 e das 15h00 às 19h00, também aos sábados das 10h00 às 14h00.
O grupo f2.8 Colectivo de Fotografia tem por objetivo potenciar e dinamizar experiências no campo da fotografia, numa diversidade de temas, estilos e abordagens, por meio da arte e da técnica de António Delicado, Armando Cardoso, Alzira Maria Avelino, Elsa Mota Gomes, Henrique Oliveira Pires, João Castela Cravo, Margarida Araújo e Vanda Foster Silva.
O tema e o título da nova exposição são inspirados numa obra do escritor italiano Italo Calvino, As Cidades Invisíveis, de que extraímos um trecho significativo:    

É o humor de quem a olha que dá à cidade (…) a sua forma. Se passarmos por ela a assobiar, de nariz no ar atrás do assobio, conhecê-la-emos de baixo para cima: sacadas, tendas a ondular, repuxos. Se caminharmos através dela de queixo contra o peito, com as unhas espetadas nas palmas das mãos, os nossos olhares prender-se-ão ao chão, aos regos de água, aos esgotos, às tripas de peixe, ao papel velho. Não se pode dizer que um aspecto da cidade seja mais verdadeiro que o outro (…).

In As Cidades Invisíveis, Lisboa: Teorema. p.68).



DEZEMBRO DE 2013





CONCURSO DE POESIA ALBANO MARTINS
PRÉMIOS NA MODALIDADE "GERAL" E DE "REVELAÇÃO JUVENIL"

pessoa Personalidade maior da cultura portuguesa tem a partir de agora o seu nome ligado ao Concurso de Poesia Albano Martins, promovido pela Câmara Municipal do Fundão, região onde nasceu o poeta (freguesia do Telhado). O regulamento do concurso acaba de ser aprovado por unanimidade em sessão pública do município. Os prazos do concurso (anual) serão determinados pelos serviços da Biblioteca Municipal Eugénio de Andrade que oportunamente divulgarão as datas. O regulamento cria a modalidade “Geral” para candidatos com mais de 18 anos e o Prémio Revelação Juvenil até aos 18 inclusive. Serão admitidos apenas poemas inéditos, o texto não poderá ultrapassar uma folha A4, e cada candidato não deverá apresentar mais de dois poemas. As candidaturas terão de obedecer a pseudónimo, devendo a identificação completa constar num subscrito fechado.
O Município do Fundão vai entretanto difundir em pormenor as regras do concurso, podendo adiantar-se que na modalidade “Geral” haverá as categorias de primeiro, segundo e terceiro prémios; o regulamento prevê ainda (além do Prémio Revelação) a entrega de diplomas de participação.
Informações mais atualizadas poderão ser solicitadas por meio de correio eletrónico a:
bib.municipaleugenioandrade@gmail.com

ou por correio postal para a seguinte morada:
Biblioteca Municipal Eugénio de Andrade
Rua Conselheiro José Alves Monteiro
6230-250 Fundão

O poeta Albano Martins, homenageado nesta iniciativa, é autor de uma vastíssima obra que se afirmou ao longo de mais de seis décadas, e continua a afirmar-se, com a palavra depurada, o verso límpido, uma estética exemplar. Mestre da síntese, os seus poemas são a imensidão dos sentidos ditos, escutados, partilhados no mistério mais profundo do silêncio poético. Refiram-se (e citamos apenas alguns) livros seus como Coração de Bússola, Uma Colina para os Lábios, Inconcretos Domínios, Rodomel Rododentro ou Três Poemas de Amor Seguidos de Livro Quarto.
Autores universais, de Salomão a Rafael Alberti, de Safo a Giacomo Leopardi, de Nicolás Guillén a Neruda, conheceram igualmente a arte da tradução que Albano Martins tem exercido com incontestável saber e apuro, devendo sempre destacar-se essa obra magistral que concretizou em 2009, intitulada Antologia da Poesia Grega Clássica.



TAMBÉM NESTE SÍTIO
GRANDE ENTREVISTA A ALBANO MARTINS



NOVEMBRO DE 2013







ERNESTO RODRIGUES
DUPLO LANÇAMENTO EM LISBOA, DIA 27

pessoa










Esta bela fotografia de Nuno Calvet faz a capa do novo romance
de Ernesto Rodrigues

Autor de uma extensa e múltipla obra, do ensaio à poesia, passando pela ficção, o escritor Ernesto Rodrigues está de volta com dois livros, o romance histórico A Casa de Bragança e a coletânea de poemas Do Movimento Operário e Outras Viagens (Âncora Editora). O duplo lançamento decorrerá na próxima quarta-feira, dia 27, às 18h30, na Livraria Ferin (Rua Nova do Almada, 70 — Lisboa).
No nosso espaço ‘LIVRARIA’ apresentamos um resumo temático do novo romance de Ernesto Rodrigues.





NOVEMBRO DE 2013







MÁRIO DIONÍSIO
PERCORRENDO, VINTE ANOS DEPOIS, «UM RASTO DE PRATA»


pessoa Escritor, pintor, professor. Histórico doutrinador do neo-realismo. Uma vida dedicada também à luta política porque sentia, «como um espinho na carne, o dever de lutar pela felicidade dos outros».
Perguntámos recentemente ao escritor Mário de Carvalho quais eram os livros da sua vida. Num grupo restrito de quatro autores elegeu A Paleta e o Mundo, de Mário Dionísio, justificando: «É altura de relê-lo devagar, parando em cada obra de arte e confrontando o seu arguto olhar com o nosso».
O poeta José Gomes Ferreira disse que Mário Dionísio pertencia ao grupo de pessoas «que deixam um rasto de prata» em tudo o que criam.
No momento dos vinte anos da morte de Mário Dionísio percorremos, no essencial, esse «rasto de prata».





NOVEMBRO DE 2013







CENTENÁRIO DE ÁLVARO CUNHAL
DIGRESSÃO CULTURAL PELO "OUTRO LADO" DO POLÍTICO


pessoa
Tudo quanto Álvaro Cunhal criou como escritor e artista plástico tinha uma assinatura política, porém sabiamente desnecessitada de panfletismo. O militante político visionário, agreste, também vigoroso e coerente como intelectual, deixou um legado literário e artístico que revisitamos no dia do centenário..





NOVEMBRO DE 2013







JOSÉ JORGE LETRIA
COLÓQUIO DE HOMENAGEM EM COIMBRA




Os 40 anos de vida literária de José Jorge Letria, já abordados desenvolvidamente neste espaço (março p.p.), serão amanhã, dia 29, celebrados em Coimbra, primeiro na Universidade e mais tarde no Museu Nacional de Machado de Castro.

Às 9h45 terá início na Faculdade de Letras um Colóquio com uma mensagem introdutória de Guilherme d’Oliveira Martins, seguindo-se as intervenções:

10h00
Fernando Pinto do Amaral (Univ. de Lisboa), "A poesia de José Jorge Letria – Algumas notas de leitura".
Maria do Céu Fialho (Univ. Coimbra, UI&D-CECH), "A Antiguidade Clássica em José Jorge Letria".
11h45
Miguel Real, "José Jorge Letria e o romance histórico".
Teresa Carvalho (Univ. Coimbra, UI&D-CECH), "José Jorge Letria": da ode muito pouco triunfal ao canto épico”.
15h00
Adriana Freire Nogueira (Univ. Algarve, UI&D-CECH), "José Jorge Letria – o sentido da canção".
Maria Teresa Macedo (Univ. do Minho), "Ideologia(s) e Ficção: as Bio-historiografias na obra Infanto-Juvenil de José Jorge Letria".



Museu Nacional de Machado de Castro


18h00 - Lançamento do livro E Tudo Era Possível (Clube do Autor), de José Jorge Letria, com a presença da editora, Cristina Ovídio, e apresentação de Manuel Frias Martins.

Encerramento – José Jorge Letria.

A Comissão Organizadora desta iniciativa é constituída por Maria do Céu Fialho e Teresa Carvalho.


OUTUBRO DE 2013








UNIÃO BRASILEIRA DE ESCRITORES
AUTORES PORTUGUESES DISTINGUIDOS NO BRASIL



A União Brasileira de Escritores acaba de distinguir autores portugueses pelo conjunto das respetivas obras. Todos os anos, esta instituição do Rio de Janeiro, através de sua Diretoria, elege os melhores livros e autores para atribuir honrosos prémios que têm como patronos magnânimas figuras da história literária e científica do Brasil e de Portugal.
Na presente edição foram premiados:

Gonçalo Salvado
Prémio Sophia de Mello Breyner Andresen
Victor Oliveira Mateus
Prémio Eugénio de Andrade
Miguel Barbosa
Prémio José Saramago
Pedro Miguel Salvado
Prémio Joaquim de Montezuma de Carvalho


Dos autores brasileiros destacamos: Fábio Lucas (Prémio Guimarães Rosa), António Carlos Secchin (Prémio Fernando Pessoa), Diego Mendes Sousa (Prémio Castro Alves), Marcus Vinícius Quiroga (Prémio João Cabral de Melo Neto), Beatriz Rosa Dutra (Prémio Clarice Lispector), Elisa Flores (Prémio Vinícius de Moraes), José Sebastião Ferreira (Prémio Murilo Mendes), Idalina P. A. Gonçalves (Prémio Florbela Espanca).

A sessão da entrega do prémio decorrerá amanhã, dia 25, na Academia Brasileira de Letras.
Casal das Letras fez breves entrevistas a dois dos autores distinguidos, os poetas Gonçalo Salvado e Victor Oliveira Mateus.

 




GONÇALO SALVADO
«Gostaria de morrer como S. Juan da Cruz:
a ler o Cântico dos Cânticos,
sozinho ou acompanhado»


Acerca da poesia de Gonçalo Salvado pronunciaram-se autores e críticos como Perfecto E. Quadrado: «É daqueles poetas a quem foi dado o dom de recriar o mundo e a luz e os nomes e as formas e as cores e os perfis do amor mais transparente e puro. Carlos Nejar: «Extraordinário poeta do amor, onde a música se alia ao fascínio das imagens, com a capacidade de sugerir, mais do que dizer, tocar a carnação do verso sem ferir a árvore». Maria Augusta Silva: «Um poeta fascinante no cântico do amor e do corpo da mulher amada.» E António Ramos Rosa: «Poeta lírico e erótico de um lirismo muito claro e muito perfeito, de uma claridade e unidade estilística extraordinárias».



Ao ver a sua arte poética distinguida com o Prémio Sophia de Mello Breyner Andresen que pensamento teve de imediato?
Um único e simples pensamento: uma imensa satisfação, e principalmente, porque o prémio me foi atribuído sob o signo de Sophia de Mello Breyner Andresen pela prestigiada União Brasileira de Escritores.

Que mais admira em Sophia?
Embora em todas as suas vertentes de imensa criadora Sophia revele acentuada originalidade é no entanto a sua faceta de poeta que ao longo do tempo mais me tem atraído. Na verdade, na poesia de Sophia reencontrei essa manhã inicial a que todo o poeta aspira  como ponto de partida e de chegada para a criação do poema. Por outro lado, encanta-me o seu dom extraordinário de dizer com as palavras mais simples “a irradiação duma felicidade divina interior ao universo”, como ela própria escreveu.

Ao receber da União Brasileira de Escritores um galardão tão prestigiante, perguntamos-lhe como sente, também, a literatura brasileira, nomeadamente a criatividade no domínio da poesia?
Conheço muito bem a poesia amorosa e erótica brasileira, que é aquela que mais me interessa. Desde os poetas românticos (com os quais tanto me identifico) até aos nossos dias, o Brasil deu ao mundo uma  Arte de Amar de extraordinário vigor e intemporalidade.  

A celebração, podemos mesmo dizer, sagração, do corpo da mulher na lírica do Gonçalo é uma felicidade ou uma idealização da felicidade?
No dia em que concretizar a felicidade a que a minha poesia aspira, esta tornar-se-á inútil e deixarei de ser poeta. Escrevo  para  sonhar em cada verso, o Paraíso.

O amor e o belo erótico fundam-se na posse dos corpos ou na sensibilidade/sensualidade do espírito?
Não há erotismo sem palavra. Quer dizer: sem a mediação do espírito.

Goethe defendia que o amor adoece quando não se ama sem reservas… A sua poesia persegue esse não-limite?
O amor está  no centro da minha  poesia e não admite quaisquer reservas ou limites. A paixão pelo corpo, como confluência de êxtase, de plenitude  e não raramente de utopia, é infinita.   

Já chorou por amor?
Sem dúvida que sim. Sei bem o que é sofrer por amor.

Acredita no paraíso de Adão e Eva?
Toda a minha poesia é uma ”rememorização” desse lugar. E uma humilde nota-de-rodapé a outro grande texto bíblico, o Cântico dos Cânticos. Eu “sou” esse Poema. Não há verso meu que não tenha como pano de fundo o Cântico dos Cânticos.  Um dia gostaria de morrer como S. Juan da Cruz: a ler o Cântico dos Cânticos, sozinho ou acompanhado.

Diz em versos seus do livro Seminal: No pomar do teu corpo / todos os frutos / são de pecado. Pecado é o quê? 
Não é, decerto, em sentido teológico uma falta. Nem uma queda. Mas uma saborosa vertigem que urge, a cada instante, perseguir.

Como reage ao alheamento da cultura que parece ser a única coisa a progredir no nosso país?
Mal dos tempos que nos coube viver. Lamento profundamente a incapacidade da nossa classe política de entender a cultura como um factor de progresso e de excelência.

Que verso, que poema, gostaria de enviar neste momento para seu pai, esse poeta ímpar que é António Salvado?
Este mesmo poema que escrevi recentemente para meu pai, sabendo do seu amor pela cultura greco-latina:


       a meu pai

avança
mergulha
ressurge
emerge das vagas
esbelta
rútila
queima
com suas curvas
a espuma

ninfa do mar

antiquíssima




Gonçalo, a sua poesia e a sua pintura são almas gémeas? Conseguiria viver sem uma delas?
Obedecem à mesma pulsão e necessidade. Desde que me conheço que escrevo e desenho compulsivamente. Sim: morreria se não escrevesse (ó Rilke) e desenhasse.

Próximo livro, quando?
Muito brevemente publicarei um novo livro que dá continuidade ao meu universo.



 



VICTOR OLIVEIRA MATEUS
«Continua a insistir-se numa conceção
de escola burocratizada
e que tresanda a Idade Média»


Autor que tem a mestria de casar o clássico com a modernidade, da sua poesia disseram entre outros: Olga Savary: «Como um espia ou um detetive de afetos, abandonando-se num tufo de metáforas, eis a periculosidade do poeta, especialmente do poeta português Victor Oliveira Mateus. Nas asas da poesia, Victor solta os pássaros e canta — e voa. (…)». Cláudio Neves: «Victor escreve no limite entre a poesia e a prosa, e nos faz crer que o faz sem perigo — quando, nesse perigoso limite, muitos poetas de diversos calibres se têm perdido.» Alexandre Bonafim: «(…)Em sua escrita, o deserto torna-se região das especulações filosóficas, dos encontros e desencontros com o outro. Aliás, o deserto de Victor possui uma ambiguidade importante. É nesse espaço que o eu lírico vivenciará tanto a solidão quanto o total da entrega ao outro-amado. Para Victor, somente o mergulho no exílio do mundo e do outro poderia gestar o arrebatamento dos encontros profundos(…)». Maria Augusta Silva: «(…) Uma escrita na qual as palavras são a mágica tranquilidade (sábia viagem) com que o poeta tem vindo a trabalhar a consciência do texto.» Ana Paula Dias: «A forte aptidão metafórica da poesia de Victor Oliveira Mateus, pelo inesperado de certas associações lexicais e pelo fulgor de imagens extremamente certeiras e originais, consubstancia-se numa fala subtil que se move em torno do movimento em direção ao Outro e da noção de Ausência; nela joga-se a inquietação do sujeito num mundo polarizado entre o Absurdo e a Graça, o Efémero e a Luz (…).» Henrique Levy: «(…) A poesia de Victor Oliveira Mateus ensina-nos o poema como semente aquecida no coração da memória, resgatada pela alma, oferecida e alimentada pelo corpo. Comovem-me as palavras, as letras, a ética do poema (…)».





Ter a sua obra poética distinguida com o Prémio Eugénio de Andrade da União Brasileira de Escritores representa o quê ao fim de muitos anos de escrita?
Há sempre uma determinada alegria quando sentimos que o nosso trabalho ecoa noutras mentes, noutras regiões, contudo penso que é importante aceitarmos, com muita prudência, tudo aquilo que nos é dado, pois o excesso de confiança pode condicionar a violência da queda. Foi grande a minha satisfação, foi grande a minha gratidão para com aqueles que de mim se lembraram. Mas no essencial sigo sendo o mesmo.

Um dos versos de Eugénio de Andrade era, e mantem-se, profundamente perturbador: «Quando se morre?». O Victor achou alguma vez resposta para esta interrogação?
Jaspers fala do confronto com a morte como uma dessas situações-limite, que, pela sua inexplicabilidade, nos estimula a ousadia do procurar respostas.

Já se confrontou com a morte?
Por volta dos trinta anos. Dois anos dialoguei com ela todos os dias. Não parti… não parti e nunca mais pensei nela! A questão da morte não me atormenta, aliás, numa das suas entrevistas Clarice Lispector diz que o escritor morre muitas vezes. Somos ínfimos e estamos de passagem, urge não esquecer isso. A questão que me atormenta é outra: «Que coisa é esta a que chamamos vida?»

Se ainda pudesse falar com Eugénio de Andrade, que gostaria de contar-lhe?
Não conheci pessoalmente Eugénio, privei (e privo) com poetas igualmente grandes dessa geração; por esta minha experiência, não me parece que aquilo que, eventualmente, tivesse a dizer-lhe lhe pudesse interessar, assim como, talvez por egoísmo, preferisse escutá-lo a falar. Pertenço a uma geração de autores que, sem cair num encumear artificioso, cultivou sempre uma sentida deferência para com as gerações anteriores.

Já descobriu um pôr-do-sol mais fascinante do que o da praia de Lefteris, de que nos fala no seu livro A Irresistível Voz de Ionatos?
Interessante a pergunta. A Gulbenkian chegou a proporcionar um encontro entre mim e Angélica Ionatos, aquando de um dos seus concertos em Lisboa. Eu estava com uns amigos e ela ficou surpreendida por ter inspirado um poema tão grande como aquele. Não sei se vi algum pôr-do-sol mais fascinante do que esse de que fala o meu poema… todos são simultaneamente iguais e diferentes.

E cada um de nós olhará a natureza de modo diverso…
Não tenho uma visão cartesiana da Natureza, da qual derivam muitas visões poéticas, sobretudo as que se fundamentam num certo niilismo individualista; a minha Natureza é sagrada, é a que vem de Plotino e dos Renascentistas, mas já estou a fugir à pergunta…

Algum homem poderá ser uma ilha?
Neste momento travo uma luta com François de Singly exatamente por causa desse tema. Olho com alguma desconfiança as virtudes do individualismo, ou melhor, reconheço que as ilhas podem ser belas e regeneradoras, mas temo que elas esqueçam os arquipélagos para que sempre tendem.

Trabalha a sua poesia com uma incontestável sobriedade estilística. Requere muito ofício até chegar a esse apuro?
Sou cauteloso, talvez seja isso. Não quero que aquilo que me sai das mãos resulte de um qualquer tipo de trabalho exclusivamente formalista e alheio à vida concreta dos homens. Isto não é um juízo de valor, estou só a falar de mim. Cada um tem o seu caminho e o meu passa por uma Escuta atenta daquilo que Há e pela tentativa — tantas vezes gorada! — de que esse Sentido se possa desvelar através do dizer poético.

A formação que tem em filosofia ajudou-o enquanto poeta?
Para ser franco não tenho um distanciamento de mim que me permita dizer algo sobre isso. Quando escrevo um artigo, quando faço uma recensão, é um facto que no meu fazer está sempre aquele aparelho teórico da filosofia e creio que o mesmo sucede nos poemas. Sim, acho que a filosofia em mim tem algo de condenatório: infiltra-se no interior do verso independentemente da minha vontade.

Que diz agora o poeta ao filósofo? Que diz o filósofo ao poeta?
É o poeta que deve dizer ao filósofo, penso. Os Antigos sabiam isso. A poesia liga-se a um olhar primeiro, a um olhar que visa o originário e, nesse sentido, a filosofia joeira aquilo que lhe chega através de uma sucessão de olhares; a filosofia, quanto a mim, padece de uma menoridade ontológica na sua relação com aquilo que Há.

Foi professor de Filosofia. Colheu muitas lições dos seus alunos?
Lamentavelmente, nos últimos anos, ensinaram-me muito pouco, ensinaram-me tão-só aquilo que não deve ser a escola. Há uma profunda hipocrisia no modo de viver hoje o ensino: por um lado fala-se de desmotivação, de abandono escolar, etc, por outro lado, continua a insistir-se numa conceção de escola burocratizada e que tresanda a Idade Média.

Entretanto, na arte da tradução, de que autor se sentiu mais próximo ao traduzi-lo?
Voltaire. Tenho uma profunda admiração pelo séc. XVIII francês, mais especificamente por Voltaire, autor que sempre me fascinou.

Neste momento, qual a palavra que gostaria de sublinhar na sua «gramática dos afetos»?
Paixão. Os seres incapazes de se apaixonar assustam-me, muitos deles rondam as psicopatias e, quando frios e ávidos de poder, são perigosos, mas prefiro não desenvolver o tema…

Pois… E a velhice assusta-o?
Não. Assusta-me a decadência, que pode surgir em qualquer idade, a velhice não. Há um excelente romance de Louise Weiss sobre a velhice, Dernières Voluptés, e um outro da Vita Sackville-West, Toda a Paixão Abolida. A visão que temos hoje da velhice é aquela que a moral burguesa e a sociedade dos números tem vindo a difundir: o velho-fardo, o velho-não-produtivo, o velho-que-já-está-atrasado-para-a-morte, etc. É dentro deste paradigma que a velhice assusta. Mas nem sempre foi assim e pode nem sempre ser assim: tive amigos de muita idade, alguns grandes escritores, com quem aprendi imenso.

Num só verso, como resumiria o nosso país?
Que Camões me perdoe a soberba:
"Ó glória de mandar, ó vã cobiça".


OUTUBRO DE 2013







MÁRIO BERNARDO
«TROIKA» POR GENTE FORMADA


pessoa Publicamos um belo texto memorialístico do Professor Mário Bernardo, médico (e atual estudante de Belas-Artes, faz questão de assinalar) que nos honra com a sua presença no espaço "Convidados". Reporta-se ao tempo em que era assistente de Anatomia, tendo conhecido duas figuras que o marcaram para sempre: José Guilherme Jordão, que seria seu monitor, e Mário Botas, que seria seu aluno. Escreve: «… foi um bom ano porque eu, sendo assistente, assistia, o José Guilherme Jordão, sendo monitor, monitorizava e o Mário Botas, como era aluno, alunava, ou seja, sempre com uma voz calma e um sorriso tranquilo, e tranquilizador, passava as aulas a desenhar, num diálogo com uma figura que ele já via no papel mesmo antes que nós a descortinássemos…».





SETEMBRO DE 2013







MÁRIO BOTAS
A "MORTE INFAME" HÁ 30 ANOS COM 30 ANOS


pessoa
Tinha trinta anos. Uma leucemia resistente a todas as terapêuticas frustrou a batalha íntima de Mário Botas com os seus deuses e demónios. No ano anterior ao da morte, o pintor-poeta consultou pela segunda vez médicos estrangeiros (ingleses e americanos), na esperança de melhoras para a doença que se agravava dia a dia. Estes, porém, desenganaram-no. Sabendo que teria pouco tempo de vida, arrendou uma casa na serra de Sintra, entregando-se por completo à criatividade pictórica. Labor intenso que duraria pouco mais de um ano. Mas grande é a obra que nos deixou.
Evocamos Mário Botas, o génio que foi vítima de uma «morte infame», como disse um dia o poeta António Osório





SETEMBRO DE 2013







ANTOINE DE SAINT-EXUPÉRY
PRINCIPEZINHO SEPTUAGENÁRIO


pessoa No mês em que O Principezinho, imorredoura criação de Antoine Saint-Exupéry, perfaz setenta anos, evocamos esta obra universal. Oportunidade para registar o que pensam algumas figuras da literatura juvenil portuguesa sobre o menino eterno que tinha o sonho de voar, de ultrapassar os limites do espaço onde nasceu, de ver novos lugares e novas gentes. E pensamentos estranhos como este: «Só se vê bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos!»



SETEMBRO DE 2013







ANTOLOGIA
JORNADA POÉTICA EM LISBOA


A antologia Doce Inimiga vai ser apresentada em Lisboa, dia 28, às 16 horas, na Livraria Pó dos Livros. É o momento de assinalar a jornada poética que decorre a nível internacional promovida pelo Movimento Mundial 100 Mil Poetas por el Cambio por meio do Word Poetry Movement (WPM) e do Liceo Poético de Benidorm, representados em Portugal por Maria do Sameiro Barroso, poeta a quem coube coordenar esta obra editada pela Labirinto. Mais de duas dezenas de autores integram Doce Inimiga: Albano Martins, Alice Macedo Campos, Amosse Mucavele, Ana Pinto, António Salvado, Artur Coimbra, Carlos Vaz, Cláudio Lima, Daniel Gonçalves, Delmar Maia Gonçalves, Gisela Ramos Rosa, Harold Alvarado Tenorio, Isabel Mendes Ferreira, José Jorge Letria, João Rasteiro, Jorge Velhote, José Assuncíon Silva, Juliana Miranda, Julio Pavanetti, Maria Augusta Silva, Maria Azenha, Maria do Sameiro Barroso, Maria Teresa Dias Furtado, Pedro Saborino, Pompeu Miguel Martins, Ricardo Gil Soeiro, Ricardo Marques, Teresa Rita Lopes e Victor Oliveira Mateus. Na sessão do dia 28 irão ser lidos poemas desta antologia, inclusive pelos autores que participarem no encontro.


SETEMBRO DE 2013







PEDRO ALMEIDA VIEIRA
EPISÓDIO BÍBLICO DO MAR VERMELHO NA AGENDA DO ROMANCISTA


pessoa Longínquos vão os tempos de um curso de Engenharia Biofísica na Universidade do Porto e os empenhados combates enquanto ativista da Liga para a Proteção da Natureza, da Quercus e do Observatório de Ambiente (missões distinguidas com o Prémio Nacional Fernando Pereira). Pedro Almeida Vieira continua atento às temáticas do ambiente e do ordenamento do território, porém elegeu há dez anos, de forma não menos perene, o romance histórico.
Na ocasião do lançamento do seu primeiro livro neste género (com o título Nove Mil Passos), disse: «A história não tem de parar quando não há documentos.» Mas a erudição histórica do autor, igualmente a sua capacidade de recriação do espírito da época narrada, da estrutura mental e social com seus costumes e rituais convertem-se em atributos éticos que todos os leitores acolherão como credíveis e rigorosos das reconstituições transportadas para a ficção.
Gratamente acolhemos no espaço "Convidados" um texto que integra um projeto literário que Pedro Almeida Vieira está a desenvolver em torno do Antigo Testamento, inspirado no famoso episódio bíblico do Mar Vermelho.





SETEMBRO DE 2013









DANIEL SERRÃO
NOSSO CONVIDADO ESCREVE SOBRE A POESIA DE RUI NUNES


pessoa O País conhece-o como cidadão íntegro devotado à ciência e à ética médica, à bioética, às questões da cultura e da cidadania. O Professor Daniel Serrão, que nos honra como nosso convidado, tem igualmente o culto da poesia. E fala-nos da arte poética de Rui Nunes, em particular do livro Barro, o qual, nas suas palavras, é «complexo, estranho — mas misteriosamente sedutor.» Acolhemos gratos o Professor Daniel Serrão para analisar uma poesia que deve ser lida, relida, sentida, pensada.




JULHO DE 2013









ALMADA NEGREIROS, 120 ANOS
UM DIA NA QUINTA DA LAMEIRINHA, EM BICESSE


pessoa

A Quinta da Lameirinha, com três moinhos de vento, em Bicesse; a quinta onde Almada Negreiros, porventura, mais refletiu sobre a harmonia suprema da claridade. Uma claridade que ia do chão ao pensamento, tocando a abóbada da consciência, a projetar-se mais longe, por meio da arte que vive do infinitamente pequeno ao infinitamente grande





Fotografia: Sarah Afonso e Almada Negreiros na Quinta da Lameirinha




JULHO DE 2013









LUÍS DE STTAU MONTEIRO
REBELDE E LIVRE


pessoa Evocamos o jornalista e escritor que marcou intensamente a vida cultural e política em Portugal durante a segunda metade do século passado. Inquieto e irrequieto, em permanente desassossego, Luís de Sttau Monteiro tinha um modo desafiante de olhar o mundo e os outros. Foi especialmente representativo de uma geração cheia de ideias e de ideais que no regime ditatorial correu riscos, conheceu a prisão em nome de valores como a liberdade e a dignidade de cada indivíduo e dos povos.




JULHO DE 2013








MORREU GUILHERME DE MELO
PERMANECE A CLARIDADE DOS TEUS OLHOS


pessoa Um sorriso longo e fraterno. Um olhar de céu e mar, muito azul, feliz. Camarada de décadas no jornalismo, sobretudo no Diário de Notícias. Virava as adversidades do avesso, desafiava preconceitos e falsos anjos. Morreu de pazes feitas com o mundo. Lembramo-lo numa crónica de Maria Augusta Silva e numa desassombrada entrevista realizada na ocasião do lançamento do seu livro o Homem que Odiava a Chuva.




JULHO DE 2013








ACONTECIMENTO FOTOGRÁFICO EM LISBOA
TRABALHO MINEIRO É TEMA DE EXPOSIÇÃO NO MUSEU DE ARTE POPULAR





«Como quem lavra as entranhas da Terra» - Projecto Minas


Qualidade artística a par da riqueza documental de um tema pouco divulgado, eis a essência do acontecimento fotográfico que será a exposição a inaugurar no próximo sábado, dia 29, às 15h30, no Museu de Arte Popular, em Lisboa, onde se manterá três meses. Imperdível para quem gosta de viajar pelo mundo real que o tempo tornou tão remoto que parece irreal.
As minas, expressão milenar da dilacerante faina da exploração do interior da Terra, geram cicatrizes nos homens e na paisagem. Transpor com arte e emotividade essas cicatrizes perenes para imagens fotográficas foi o projecto empreendido por oito autores que, num modelar companheirismo criativo, se coligam desde 2007 sob a denominação de f2.8 Colectivo de Fotografia. Para nosso proveito cultural oferecem agora esta exposição que reúne mais de meia centena de imagens impressionantes. Não será um término, antes um começo, um ponto de partida para novas expedições, pois o grupo persegue um objetivo primordial: «Potenciar e dinamizar experiências individuais e coletivas no campo da Fotografia, numa diversidade de temas, de estilos e de abordagens».
Registamos com agrado e reconhecimento os seus nomes: António Delicado, Armando Cardoso, Alzira Maria Avelino, Elsa Mota Gomes, Henrique Oliveira Pires, João Castela Cravo, Margarida Araújo e Vanda Foster Silva.
De notar que quatro destes autores já concretizaram um outro projecto fotográfico de excelência, igualmente artístico e documental e não menos meritório, intitulado "Ruínas (Já só Eco. Já só Memória)", que aguarda a disponibilidade de um espaço, o que não é fácil neste país fidalgaço prá arte "a sério" e onde o espaço nunca é escasso pró amigalhaço, já lá dizia o doutor Colaço.
Uma palavra de apreço é devida, portanto, ao Museu de Arte Popular pelo acolhimento dado a uma iniciativa culturalmente tão válida como esta que será inaugurada no próximo sábado.  PF



Pórtico da exposição pelo f2.8 Colectivo de Fotografia

Nós, os Homens, somos fracos. A nossa força só aparece quando nos unimos à Terra, quando a lavramos! É preciso rasgar a Terra para lhe beber a força. Se a lavramos à superfície bebemos-lhe a seiva através das plantas, se lhe rasgamos as entranhas, então acrescentamos força às nossas mãos para trabalhar, para lutar, até para amar, construímos casas e caminhos, alimentamos as nossas vaidades… fazemos coisas belas… arrancamos a riqueza à Terra e o nosso ser aumenta!
Esta tarefa, milenar e sempre árdua, deixa cicatrizes na Terra. Mais evidentes ou menos, elas aí estão, locais onde se misturam as memórias, a pele e o sangue dos homens que na Terra, nas pedras, cravaram as mãos e deixaram a alma!
Fotografar estas cicatrizes é um projecto fotográfico do f2.8 Colectivo de Fotografia que começou em 2007. Primeiro, focalizado apenas na Faixa Piritosa Ibérica, mas que depois se foi ampliando a outras minas e outras formas de explorar o interior da Terra, de lhes arrancar as matérias primeiras com que fazemos o Ser Homem — o pensamento e a acção!
E se esse fazer o Ser Homem implica criação — então não há melhor local para mostrar este projecto do que um Museu construído para se tornar memória da criação artística dos Homens simples, que à força de braços, provocaram, alguns deles, as cicatrizes-memórias que aqui queremos mostrar!

Local, calendário e horário

A exposição pode ser visitada no Museu de Arte Popular (Av. de Brasília, Lisboa), de quarta a domingo, das 10h00 às 18h00, até 30 de setembro. Inauguração: 29 de junho, às 15h30.








FRANCA RAME PARTIU SEM AUTORIZAÇÃO
Oscar Mascarenhas evoca histórica atriz italiana


pessoa Soube agora, madrugada de 22 de junho, pelo obituário de José Cutileiro no "Expresso" (o embaixador A. B. Kotter de "O Jornal") que a Franca Rame tinha falecido a 29 de maio. Nunca me esquecerei de Franca Rame, atriz, dramaturga, militante incansável italiana, que deixa viúvo o Prémio Nobel Dario Fo, aquele que foi determinante para que no ano seguinte José Saramago viesse a ser o contemplado. Vi uma atuação de Franca Rame, em Milão, nos anos 90, num teatrinho completamente esgotado: "Sexto: Rouba um pouco menos" era o nome do monólogo escrito por Dario Fo. Falava de corrupção. Franca Rame era extraordinária como atriz e improvisadora: representava e dialogava com o público, ao mesmo tempo. Não era personagem, era personalidade. O soco no estômago, porém, estava para chegar: fiquei a saber que Franca Rame, um dia por semana, destinava a receita do espetáculo às comissões de trabalhadores de Milão. A minha querida, adorada, idolatrada e nunca por demais gabada Franca Rame começou mais cedo a entregar-se à causa do que os nossos artistas de Abril – e manteve-se na luta muito, mas muito mais tempo. Como diria o Che4 "crear dos, tres, muchas Francas Rame, es la consigna". (O Che falava do Vietname, como força de resistência contra o poder norte-americano...)
Malta, cumpramos o que a Franca Rame pediu como elegia fúnebre: que cantássemos a "Bella Ciao", cantiga com mais de cem anos, dos trabalhadores dos arrozais do Pó (e já nessa altura cantavam: "E trabalharemos em liberdade") e que no fascismo italiano se converteu em hino da Resistência.

Aí vai a letra, companheiros:


Bella ciao

‘Sta mattina mi sono svegliato,
o bella, ciao! bella, ciao! bella, ciao, ciao, ciao!
‘Sta mattina mi sono svegliato,
e ho trovato l'invasor.

O partigiano, portami via,
o bella, ciao! bella, ciao! bella, ciao, ciao, ciao!
O partigiano, portami via,
ché mi sento di morir.

E se io muoio da partigiano,
o bella, ciao! bella, ciao! bella, ciao, ciao, ciao!
E se io muoio da partigiano,
tu mi devi seppellir.

E seppellire lassù in montagna,
o bella, ciao! bella, ciao! bella, ciao, ciao, ciao!
E seppellire lassù in montagna,
sotto l'ombra di un bel fior.

Tutte le genti che passeranno,
o bella, ciao! bella, ciao! bella, ciao, ciao, ciao!
Tutte le genti che passeranno,
Mi diranno «Che bel fior!»
«È questo il fiore del partigiano»,
o bella, ciao! bella, ciao! bella, ciao, ciao, ciao!
«È questo il fiore del partigiano, morto per la libertà!»


Insubmissa e senhora do seu destino — ninguém é perfeito! — Franca Rame partiu sem autorização. Vai-me custar perdoar-lhe.


Oscar Mascarenhas
22 de junho de 2013








NOVO LIVRO DE MARIA DO SAMEIRO BARROSO
TARDE DE POESIA NO DIA 24 EM LISBOA


matilde
Novo livro de Maria do Sameiro Barroso, intitulado Luas de Gengibre, vai ser lançado segunda-feira (24 de Junho), às 18h00, na Livraria Pó dos Livros, em Lisboa. A apresentação está a cargo da Professora Teresa Rita Lopes. Com a chancela da editora Labirinto, esta obra poética é prefaciada por Alfredo Pérez Alencart, poeta e ensaísta peruano-espanhol, professor da Universidade de Salamanca que sobre a poesia de Maria do Sameiro diz: «Magnífica marea de treinta poemas que dejarán huella en la lírica lusitana de este siglo. Yo saludo la obra de tan destacada poeta, palabras o savias preñadas de esos sueños que se corresponden com media vida del hombre.»
Na sessão de lançamento, Maria Teresa Dias Furtado e Gisela Ramos Rosa vão ler poemas de Luas de Gengibre, livro de que reproduzimos o poema seguinte:


AURORA BOREAL

O corpo é igual ao corpo,
e bate nas colunas demoníacas
dos barómetros sem resposta;
navega na luz gelada dos icebergues
invisíveis que rasgam cascos
e partem mastros.
No rasto de Deus que se eclipsa,
com versos nos olhos,
ainda podes respirar a chuva, o suor,
o labor da escrita,
nas linhas nocturnas onde a solidão
implode
no centro esfíngico

de uma aurora boreal.


JUNHO DE 2013









EXAMES POR ORDEM ALFABÉTICA DO PRIMEIRO NOME
Aarão ou Zebedeu? — pergunta o jornalista Oscar Mascarenhas


pessoa Lembro-me desta conversa, pela surpresa inesquecível que me trouxe.
Estávamos à espera de fazer orais no final do nosso primeiro ano de Direito, o Paulo Figueira e eu.
Sendo eu Oscar e ele Paulo, tínhamos a oportunidade de assistir às orais de dezenas, para não dizer centenas de colegas, antes de chegar a nossa hora.
Eu dava graças à divindade pelo facto de os meus pais terem posto nomes do meio para baixo do alfabeto aos seus cinco filhos.
Disse então ao Paulo que, se e quando tivesse um filho, chamar-lhe-ia para aí Xavier, se não mesmo Zebedeu, para lhe dar tempo para se preparar para os exames.
(Acabei por chamar Carolina, mas isso não tem que ver para o caso…)
O Paulo, ingrato para com o seu pai, o conhecidíssimo Manuel Figueira, dos jornais, ou, então, num tributo atrasado à gentileza sacrificada do autor dos seus dias, disparou:
— Eu não. Chamar-lhe-ei Alberto, quando não Aarão!
— Porquê?
— Para eu poder ir mais depressa para férias!
Fiquei siderado com o calculismo egoísta do marau!
Passados uns quarenta e sete anos, lendo o Público, fiquei a saber que os Antónios tiveram mais probabilidade de fazer exame do que as Saras e Teresas porque, com a mobilização geral de professores decretada por Nuno Crato — um estalinista nunca deixa de ser um estalinista, um estalinista, um estalinista — os estudantes iam enchendo as salas por ordem alfabética e o diretor manageiro da Casa do Conto dos professores fura-greves iam-nos designando para as salas até não haver mais canhão para as carnes.
Os Aarões tiveram de fazer exame. Não deve ter havido um Zebedeu sequer a consegui-lo.
E veja-se como o Paulo Figueira tinha razão, já não egoísta, mas em benefício do filhinho querido: as Saras e as Teresas — os Oscares e os Paulos, também, suponho —, têm exame a 2 de julho, quando já estiverem a ser corridos os taipais das escolas, quando os Aarões e Albertos tiverem de ser socorridos pela terceira vez no posto, por causa dos escaldões na praia.
"Ana bronzeia-se, Zulmira empalidece", podia ser o título prospetivo do Público.
Só de uma coisa se esqueceu o finório do Paulo Figueira: é que férias… só em novembro, diz o governo, aferrolhando a lata dos subsídios.
A tanto não chegava prometida e imaginária descaridade do Paulo!


17 de junho de 2013









DIA MUNDIAL DA CRIANÇA
CELEBRAMOS COM MATILDE ROSA ARAÚJO E MARIA KEIL


matilde Dia de celebração, de amor, de partilha. Dia também para muitas reflexões. E voltamos sempre a Matilde Rosa Araújo, essa notável contadora de histórias para os mais pequenos, na esperança de que os mais crescidos saibam igualmente entender, sentir a beleza, a pedagogia de cada palavra de uma autora imortal. Já não podemos agora falar com Matilde, escutar-lhe a ternura da voz, tocar-lhe a doçura do olhar. Refugiou-se há tempos nas estrelas. Mas deixou-nos uma obra ímpar. Se os nossos leitores forem à Feira do Livro, ali como noutros espaços livreiros, vão com certeza encontrar um número sem fim de páginas para crianças de autores imensos, quer portugueses quer estrangeiros. Ainda bem. Nós permitimo-nos trazer hoje à lembrança Matilde Rosa Araújo, a escritora de poesia e prosa, a professora, a mulher da cultura que nunca morrerá.
Do livro O Cantar da Tila (capa de Maria Keil, outro nome inesquecível), transcrevemos o poema Vida, breve diálogo poético no qual estão inteiros o pensamento, a grande lição e a sensibilidade de Matilde Rosa Araújo.
Para crianças e adultos lerem; para filhos e pais sentirem.

— Mãe! O mundo é mau,
Torna a flor num lodo
E um pássaro num verme,
E eu não sabia…

— Filha! Semeia flores no lodo,
Empresta o teu canto ao verme.
Se as tuas mãos continuarem puras
E meigo o teu coração,
Acredita que o mundo é belo.
E saberás!


De Matilde Rosa Araújo recordamos ainda uma entrevista que deu a Maria Augusta Silva.




1 DE JUNHO DE 2013









CINQUENTENÁRIO DA MORTE DE AQUILINO
A ÚLTIMA ENTREVISTA E DOCUMENTOS INÉDITOS


pessoa Coube a Pedro Foyos, nos alvores da sua carreira jornalística, fazer a última entrevista ao escritor Aquilino Ribeiro, a menos de dois meses da sua morte, há precisamente 50 anos. A entrevista, publicada no diário oposicionista República, esteve em risco de não ver a luz do dia, de tão golpeada que foi pela Censura. Num texto introdutório evoca-se a longa ponderação que antecedeu a decisão da publicação, pois foi necessário, até, cortar o que a Censura não cortara, porquanto algumas declarações sobrevivas resultaram desfiguradas. Pior destino teve um trecho literário, extraído de uma obra de Aquilino, que complementava a entrevista. Nesse caso a proibição da Censura foi integral. Quatro granéis tipográficos retraçados de alto a baixo (a encarnado, circunstancialmente, em vez do "protocolar" azul).
Sofrendo durante décadas o silenciamento a que o subjugou a Ditadura, esta foi igualmente a última vez que o autor de Quando os Lobos Uivam tomou conhecimento da proibição censória de mais um texto da sua autoria.
Ilustramos a entrevista e o relato em pormenor destes episódios com a reprodução das provas originais da Censura preservadas há meio século no Arquivo Histórico de Imprensa de Pedro Foyos.
Em benefício da legibilidade e sobretudo da visibilidade dos documentos optou-se pelo formato PDF.




MAIO DE 2013









DIA DO AUTOR 2013

CASAL DAS LETRAS DISTINGUIDO COM PRÉMIO DA SOCIEDADE PORTUGUESA DE AUTORES
«(…) ENQUANTO NOS HABITAR UMA ALMA DE JORNALISTAS DEDICADOS A CAUSAS (…)»

Por uma vez cometemos a imodéstia de ser a notícia…
Grande a emoção, imensa a gratidão de vermos este sítio, o ainda "jovem" Casal das Letras, distinguido com o prestigioso Prémio Pro-Autor da Sociedade Portuguesa de Autores, pelo «contributo para a defesa e divulgação do trabalho dos autores portugueses em diversos domínios e que merece um público reconhecimento.»
Domínios que abraçamos numa pluralidade invulgar: Literatura, Jornalismo, Artes, Ciências…
Pela primeira vez em Portugal um sítio na Internet é premiado em validação de um mérito, o da difusão cultural, corroborando o lugar de destaque que ocupa na "rede" e a audiência extraordinária expressa nos milhares de leitores que o visitam regularmente.
Em nome desse bem essencial que também a cultura é, desejamos, enquanto nos restar algum sonho e alento, e ainda enquanto nos habitar uma alma de jornalistas dedicados a causas, continuar a dar um contributo no sentido da divulgação dos nossos autores. Honra-nos esse reconhecimento por parte da SPA.
Sentimo-lo como um estímulo profundo.
Assim o saibamos merecer para sempre.
Tudo faremos para manter viva a generosa definição com que Guilherme d’Oliveira Martins abriu há semanas o seu artigo alusivo ao nosso segundo aniversário:
«Casal das Letras é um lugar de hospitalidade cultural».


Maria Augusta Silva / Pedro Foyos



         • MENSAGEM DO DIA DO AUTOR 2013 DA AUTORIA DO ESCRITOR MÁRIO ZAMBUJAL


23 de MAIO de 2013







ALBANO MARTINS
EXPOSIÇÃO BIOBIBLIOGRÁFICA NO PORTO

Por iniciativa do Instituto Cultural D. António Ferreira Gomes, a que se associam a Fundação Engº António de Almeida e a Câmara Municipal do Porto, será inaugurada no próximo dia 25, sábado, às 16 horas, na sede da Fundação Engº António de Almeida (Rua Tenente Valadim, 325, no Porto), uma vasta exposição sobre a vida e obra de Albano Martins. Poeta maior, com 82 anos de vida e 62 de escrita, Albano Martins tem-nos honrado com a sua presença assídua neste sítio.
A abertura da exposição será antecedida de uma sessão solene, durante a qual usarão da palavra, além do presidente do Instituto D. António Ferreira Gomes, Prof. Levi Guerra, os Professores Salvato Trigo, Isabel Ponce de Leão, Jorge Valentim (da Universidade S. Carlos, São Paulo, Brasil), Celeste Alves e Helder Pacheco.
A exposição estará aberta até 1 de junho, podendo ser visitada todos os dias entre as 14h30 e as 18h30 e no sábado, dia 1, entre as 14h30 e as 17h30.




MAIO DE 2013






NUNO JÚDICE PRÉMIO RAINHA SOFIA
ESCRITOR FALA-NOS DA SUA POESIA E DA EUROPA


pessoa


• «Recebi a notícia com surpresa e com a alegria do reconhecimento que o prémio constitui não tanto para mim como para a poesia da nossa língua».
• «Espero ainda que seja possível mudar a direcção suicida que a Europa tomou».




Mais de quatro décadas de poemas, com uma vasta obra que cedo se afirmou pelo apuro formal, colocando o Ser numa demanda constante, Nuno Júdice foi agora distinguido com o Prémio Rainha Sofia de Poesia Ibero-Americana promovido pelo Património Nacional espanhol e pela Universidade de Salamanca. Este galardão visa sublinhar o contributo do autor no espaço de partilha cultural no mundo ibero-americano.
Nuno Júdice, 64 anos, nascido no Algarve, surgiu com os primeiros livros A Noção de Poema e O Pavão Sonoro, em 1972, sendo igualmente de destacar os seus trabalhos no domínio da ficção e do ensaio.
O júri de 18 individualidades, entre as quais os escritores portugueses António Lobo Antunes e José Manuel Mendes, assinalou a poesia depurada de Nuno Júdice, o modo como nela se compromete o "classicismo", o imaginário e o real.





Em entrevista que nos deu poucas horas depois de anunciado o prémio, Nuno Júdice realça a alegria e o reconhecimento que o mesmo lhe suscitou, na esteira de outros já recebidos no plano internacional, ao mesmo tempo que nos confia algumas reflexões sobre a conturbada Europa de hoje, sublinhando: «Fui desde sempre europeísta, mas esta Europa não é a que idealizei».



Esperou algum dia ganhar um prémio com a universalidade do "Rainha Sofia de Poesia"?

Quem publica está sempre candidato a prémios, e isso foi sucedendo com vários livros meus de poesia e de ficção ao longo dos anos. No plano internacional já duas ou três vezes tinha tido livros na lista final do prémio «Aristeion» da União Europeia, numa altura em que ainda havia uma dimensão cultural no projecto da União. No entanto, esses prémios incidiam sobre livros e não sobre a obra, e é isso que diferencia este prémio "Reina Sofia", para além de incluir todos os países da área ibero-americana. Sabia, em conversas que tive com José Saramago e com José Manuel Mendes, que um dia isso seria possível — não receber o prémio mas ter a candidatura apresentada, o que é diferente — e foi por isso que a hipótese se me colocava, embora soubesse que muitos outros poetas de grande dimensão neste universo das línguas portuguesa e espanhola pudessem estar à minha frente.

Não deixou, porém, de ser uma surpresa…

Recebi a notícia, por esse motivo, com surpresa e com a alegria do reconhecimento que ele constitui não tanto para mim como para a minha poesia e a poesia da nossa língua.

Numa entrevista que nos concedeu em 2005 considerava o ambiente intelectual em Portugal «fechado e autodestrutivo». Mantém essa ideia?

Ao falar disso pensava na palavra «inveja» com que Os Lusíadas terminam e que nos faz olharmos para nós próprios com esse espírito de menosprezar e destruir tudo o que ultrapassa a mediania dos círculos de "amigos". Mas nunca me pus na situação de vítima e muito menos tal facto me incomoda, para além de lamentar que haja quem perca tempo com isso em vez de se preocupar em trabalhar e apurar a sua contribuição literária ou intelectual.

Camões também diz que todo o mundo é feito de mudança… Alguma coisa mudou nesse aspecto?

A situação melhorou porque tem surgido uma nova geração de pessoas com um espírito mais aberto e rigoroso, e o aparecimento de revistas de cultura, de blogues, de ensaio, já nos abrem um outro horizonte de pensamento.

E a Europa de hoje como a vê, como a desejaria?

A Europa criou uma estrutura política fechada e autista que entrou num processo de autodestruição do projecto inicial que era tratar todos os cidadãos na mesma condição de igualdade e de direitos. Hoje, faz-se com que sejam os povos a pagar os erros dos políticos que muitas vezes cometeram esses erros com a complacência e mesmo o estímulo das autoridades europeias. Fui desde sempre europeísta, mas esta Europa não é a que idealizei e espero ainda que seja possível mudar a direcção suicida que a Europa tomou.

Que livros gostaria ainda de escrever?

Todos os que puder e tiver tempo para isso. No imediato, terminarei um novo livro de poesia e queria concluir um ensaio sobre Camões e um outro sobre a ficção decadente na passagem do século XIX para o XX. Estão bastante adiantados, mas precisariam de algum tempo livre para que os apurasse.





O autor — que nos dá em cada livro a consciência suprema da linguagem — assina títulos poéticos como Linha de Água, Meditação Sobre Ruínas, Um Canto na Espessura do Tempo, O Movimento do Mundo ou A Fonte da Vida e tem visto a sua criatividade justiçada com outros prestigiados galardões, nomeadamente os prémios da APE, do Pen Clube, Dom Dinis e Fernando Namora.
De uma escrita imagética e metaforicamente intensa, realçamos ainda obras de ficção como Vésperas de Sombra, Por Todos os Séculos, O Anjo da Tempestade, A Árvore dos Milagres e A Ideia do Amor e outros contos.
Recordamos, por outro lado, uma entrevista que Nuno Júdice nos concedeu em 2005. Ao perguntarmos-lhe: «Deve a poesia espelhar o poeta?», disse-nos: «É como uma caixa. Pode ser uma caixa negra, uma caixa onde conseguimos entrar para saber aquilo que, por vezes, estava esquecido ou de que não nos tínhamos apercebido. Fica registado tudo aquilo que vivi, que fui e sou. Ao ler o poema é uma parte de mim que está ali».

                        ENTREVISTA INTEGRAL COM EXCERTOS EM ÁUDIO



Assinalamos, finalmente, que outros dois nomes maiores da poesia em língua portuguesa receberam também o Prémio Rainha Sofia: em 1994, João Cabral de Melo Neto, e Sophia de Mello Breyner Andresen, em 2003.








ARTE POÉTICA COM MELANCOLIA

Preocupam-me ainda as coisas do passado. Escrevo
como se o poema fosse uma realidade, ou dele nascessem
as folhas da vida, com o verde esplêndido de uma súbita
primavera. Sobreponho ao mundo a linguagem; tiro
palavras de dentro do que penso e do que faço, como
se elas pudessem viver aí, peixes verbais no
aquário do ser. É verdade que as palavras não nascem
da terra, nem trazem consigo o peso da matéria;
quando muito, descem ao nível dos sentimentos, bebem
o mesmo sangue com que se faz viver as emoções,
e servem de alimento a outros que as lêem como se, nelas,
estivesse toda a verdade do mundo. Vejo-as caírem-me
das mãos como areia; tento apanhar esses restos de tempo,
de vida que se perdeu numa esquina de quem fomos; e
vou atrás deles, entrando nesse charco de fundos movediços
a que se dá o nome de memória. Será isso a poesia? É
então que surges: o teu corpo, que se confunde com o das
palavras que te descrevem, hesita numa das entradas
do verso. Puxo-te para o átrio da estrofe; digo o teu nome
com a voz baixa do medo; e apenas ouço o vento que empurra
portas e janelas, sílabas e frases, por entre as imagens
inúteis que me separaram de ti.

(Do livro "Teoria Geral do Sentimento", que integra "Poesia Reunida 1967-2000"
(Publicações Dom Quixote)









DIA DO LIVRO COM FERNANDO PESSOA
ESCREVO O QUE OS OUTROS PENSAM, PORQUE ELES NÃO O SABEM DIZER



pessoa Como se define uma espiral?
Já Fernando Pessoa reflectia sobre esta magna questão em 1930.
No "Livro do Desassossego" (que escreveu com o heterónimo
Bernardo Soares) definia-a, em concreto, assim:
«… uma espiral é uma cobra enroscada verticalmente em coisa
nenhuma».
É com Pessoa que celebramos hoje o Dia do Livro, destacando um excerto dessa obra de referência universal.
Como Pessoa está vivo e atento!



27-7-1930 A maioria da gente enferma de não saber dizer o que vê e o que pensa. Dizem que não há nada mais difícil do que definir em palavras uma espiral: é preciso, dizem, fazer no ar, com a mão sem literatura, o gesto, ascendentemente enrolado em ordem, com que aquela figura abstracta das molas ou de certas escadas se manifesta aos olhos. Mas, desde que nos lembremos que dizer é renovar, definiremos sem dificuldade uma espiral: é um círculo que sobe sem nunca conseguir fechar-se. A maioria da gente, sei bem, não ousaria definir assim, porque supõe que definir é dizer o que os outros querem que se diga, que não o que é preciso dizer para definir.
Direi melhor: uma espiral é um círculo virtual que se desdobra a subir sem nunca se realizar. Mas não, a definição ainda é abstracta. Buscarei o concreto, e tudo será visto: uma espiral é uma cobra enroscada verticalmente em coisa nenhuma.
Toda a literatura consiste num esforço para tornar a vida real. Como todos sabem, ainda quando agem sem saber, a vida é absolutamente irreal na sua realidade directa: os campos, as cidades, as ideias são coisas absolutamente fictícias, filhas da nossa complexa sensação de nós mesmos. São intransmissíveis todas as impressões, salvo se as tornarmos literárias. As crianças são muito literárias porque dizem como sentem e não como deve sentir quem sente segundo outra pessoa. Uma criança, que uma vez ouvi, disse, querendo dizer que estava à beira de chorar, não «tenho vontade de chorar», que é como diria um adulto, isto é, um estúpido, senão isto, «tenho vontade de lágrimas». E esta frase, absolutamente literária, a ponto de que seria afectada num poeta célebre, se ele a pudesse dizer, refere resolutamente a presença quente das lágrimas a romper das pálpebras conscientes da amargura liquefeita. «Tenho vontade de lágrimas»! Aquela criança pequena definiu bem a sua espiral.
Dizer! Saber dizer! Saber existir pela voz escrita e a imagem intelectual! Tudo isto é quanto a vida vale: o mais é homens e mulheres, amores supostos e vaidades factícias, subterfúgios da digestão e do esquecimento, gentes remexendo-se, como bichos quando se levanta uma pedra, sob o grande pedregulho abstracto do céu azul se sentido.
Escrevo o que os outros pensam, porque eles não o sabem dizer. Não sou sincero por seriedade artística.


FERNANDO PESSOA / BERNARDO SOARES
Livro do Desassossego / Edição de Teresa Sobral Cunha / Relógio d’Água

Imagem: Fernando Pessoa visto por Bottelho


23 DE ABRIL DE 2013







O CASO DO JORNAL ASSALTADO
QUANDO O REPÓRTER É PROTAGONISTA DA PRÓPRIA REPORTAGEM

No exato dia do centenário de Raul Rego, um dos maiores jornalistas que o País conheceu, é-nos grato anunciar um novo espaço editorial intitulado "O Caso do Jornal Assaltado", da responsabilidade de Pedro Foyos, com revelações e evocações de episódios que ficaram historicamente inventariados sob o nome de "O CASO REPÚBLICA" (diário de que Raul Rego foi diretor até 19 de Maio de 1975). Era ainda primavera, mas nesse dia começou em Portugal o período revolucionário que na memória do País se perpetuaria com o nome de "Verão Quente".




15 DE ABRIL DE 2013



CENTENÁRIO DO JORNALISTA RAUL REGO
UMA VIDA DE LUTA INTRÉPIDA CONTRA A CENSURA DE SALAZAR E MARCELO

• Excerto de uma carta pessoal desconhecida do escritor Ruben A. (três meses antes da sua morte) dirigida a Raul Rego após o assalto político ao diário "República".
• Crónica de Pedro Foyos evocando o seu diretor em três jornais (um dos quais semiclandestino…), antes e depois da Revolução de 25 de Abril.
• Texto de um assombroso parecer censório propondo-se a proibição de um livro de Raul Rego no qual se fazia «um ataque cerrado» (…) «à actual política nacional, encarnada no Senhor Presidente do Conselho, Dr. Marcelo Caetano».
• Reprodução, a partir do original, de um editorial de Raul Rego cuja proibição é justificada pelo censor com uma nota manuscrita: «[texto] cheio da pior intenção política».
• Ficha da PIDE com a "biografia prisional" (parcelar) do jornalista Raul Rego «por exercício de actividades contra a segurança do Estado.

Regressaremos dentro de uma semana ao tema do centenário de Raul Rego com a inauguração de um novo espaço editorial que pretende representar uma homenagem a este vulto do jornalismo português e a quantos contribuíram para a instauração da Democracia e da liberdade de expressão em Portugal.




ABRIL DE 2013






EXCLUSIVO CRUZEIRO SEIXAS QUEBRA O SILÊNCIO E RELEMBRA
O QUE DECLAROU HÁ DEZ ANOS SOBRE A COMPRA DOS SUBMARINOS


augusto cabtita Foi há dez anos que o pintor e poeta Cruzeiro Seixas, figura histórica do Surrealismo Português, distribuiu um panfleto no qual se manifestava com veemência contra a compra de submarinos por Portugal. Passado este tempo recuperamos em áudio os dois minutos desse protesto que infelizmente não foi ouvido pelos nossos governantes. Cruzeiro Seixas, a caminho dos 93 anos, demonstra neste registo que o País estaria hoje mais rico se tivesse comprado obras de arte cuja valorização é constante e inextinguível, ao contrário dos submarinos que um dia irão para a sucata. Sem delongas, damos a palavra a Cruzeiro Seixas.
Por favor, ligue o som.



(DEPOIMENTO RECOLHIDO POR MARIA AUGUSTA SILVA)

ABRIL DE 2013






DIA MUNDIAL DA POESIA


Poesia. Poesia. Não faz mal a ninguém… É mesmo para "comer" como nos ensinou Natália Correia, recomendando-a em especial aos «subalimentados do sonho.» Neste Dia Mundial da Poesia enaltecemos todos os poetas, os que escrevem e os que leem. Temos hoje aqui um autor consagrado: José Manuel Mendes. Do seu recente livro Cinzas de Véspera destacamos:

glicínias

para José da Cruz Santos

hei-de pedir-lhes ainda
o arco e o rio
esse modo de tecer a brancura
no fulgor da casa

estão comigo desde as cidades
em viagem
sob a chuva
o vagar dos ramos
as memórias como bagas
à luz do verão

ardem
onde me quebro e reúno
entre colmeias extenuadas
cristais do feno
esboço repouso traço de húmus

hei-de pedir-lhes
a tábua do sigilo
o tumulto a raiz do tempo

arco rio feno

e a última canção



José Manuel Mendes





E partilhamos também sensibilidades e engenhos de poetas desconhecidos, de muitos que, nos mais diversos registos poéticos vivem no anonimato e, no entanto, existem, criam arte. Celebrando igualmente essa poesia desconhecida, divulgamos neste sítio de encontro um poema de Helena Marcão:


Meu Mar

Sofrendo a falta do mar. Ai!...
vi-me a chorar de mansinho
e as lágrimas do meu pranto
formavam um leve manto
não me mostrando o caminho.

Meu coração apertado. Ai!...
doía-me na garganta
e o soluço que oprimia
disfarçava a agonia
de quem chora por quem canta.

E Deus que ouviu meu lamento. Ai!...
guiou os meus tristes passos.
Levou-me à beira do mar,
corri p'ra ele a cantar
e deitei-me nos seus braços.


Helena Marcão


21 DE MARÇO DE 2013






AUGUSTO CABRITA: O REPÓRTER DO SILÊNCIO
EVOCAÇÃO DO NOTÁVEL FOTÓGRAFO E CINEASTA

augusto cabtita

"Passeio Ribeirinho Augusto Cabrita" — justo nome para uma bela alameda do Barreiro, bordejando o Tejo, ali a poucos metros. Um espaço aprazível, repousante, onde apetece de facto passear. Onde me apeteceria passear com o meu velho amigo Augusto Cabrita, o artista e o repórter, ambos com um sentido instintivo do mundo enquadrado no formato 30 x 40, de preferência horizontal porque é o mínimo que devemos conceder ao voo de uma gaivota.

AUGUSTO CABRITA
EVOCADO POR PEDRO FOYOS
NOS VINTE ANOS
DA SUA MORTE





16 DE MARÇO DE 2013






SEGUNDO ANIVERSÁRIO PRESENÇA DE MAIS DOIS VULTOS DA CULTURA
GUILHERME D’OLIVEIRA MARTINS E JOSÉ JORGE LETRIA


• Guilherme d’Oliveira Martins honra-nos com a sua presença no espaço Convidados, com um depoimento sensibilizante.



• José Jorge Letria completou 40 anos de vida poética. Oportunidade para uma breve entrevista e dois poemas inéditos que publicamos em baixo (na sequência do painel fotográfico dos nossos Convidados).

SEGUNDO ANIVERSÁRIO
A NOSSA GRATIDÃO AOS CONVIDADOS

Na celebração do segundo aniversário deste sítio de encontro e de partilha manifestamos a mais profunda gratidão aos visitantes e convidados que tanto nos enriqueceram com a sua presença e colaborações.

ALBANO MARTINS | ANDRÉ LETRIA | ARMANDO CARDOSO
BAPTISTA-BASTOS | CARLOS ADEMAR | EDITE ESTEVES
EDUARDO LOURENÇO | EUNICE MUÑOZ | FARIA ARTUR
FÁTIMA MARINHO | FERNANDO CATARINO
GALOPIM DE CARVALHO | GIL MONTALVERNE | GRAÇA PIRES
GUILHERME D’OLIVEIRA MARTINS | HENRIQUE ANTUNES FERREIRA
JOÃO RUI DE SOUSA | JOAQUIM LETRIA | JORGE REIS-SÁ
JOSÉ ALBERTO BRAGA | JOSÉ JORGE LETRIA
JOSÉ VIALE MOUTINHO | LEONOR XAVIER | LÍDIA JORGE
MANUEL MONTEIRO | MARIA AZENHA
MARIA DO SAMEIRO BARROSO | MÁRIO CLÁUDIO
MÁRIO DE CARVALHO | MIGUEL REAL | RISOLETA PINTO PEDRO
RUI BEJA | TERESA PAIVA | URBANO TAVARES RODRIGUES
VIRIATO SOROMENHO-MARQUES



                 JOSÉ JORGE LETRIA BREVE ENTREVISTA E DOIS POEMAS INÉDITOS


helena matos Na ocasião do nosso segundo aniversário celebramos um outro mais "substancial": os 40 anos de vida poética de José Jorge Letria, que entrevistámos e nos concedeu o privilégio de publicar dois poemas inéditos. Numa edição da Imprensa da Universidade de Coimbra acaba de aparecer Poesia Escolhida, antologia reunindo cem poemas de José Jorge Letria, distribuídos por quatro partes que, no seu conjunto e nas palavras do autor «se assumem como uma peça una e indivisível, num contraste com a imagem de um poeta que, não tendo, como Pessoa, uma identidade plural, a si mesmo se intitula vário».

A entrevista

Quatro décadas de escrita poética: Qual foi a emoção ao ver publicado o primeiro livro e a que sente agora ao editar Poesia Escolhida para assinalar 40 anos de versos?

Quatro décadas é muito tempo, tanto que nem me dou conta de já terem passado. Recordo-me perfeitamente da emoção desse dia. Eu era redator do República, sentado entre Vítor Direito e Álvaro Guerra, e vieram entregar-me uma pequena caixa de cartão com trinta exemplares de Mágoas Territoriais, editado pela Assírio & Alvim. Nessa tarde eu partia para Santiago de Compostela para fazer uma atuação com José Afonso, para muitas centenas de estudantes galegos em greve. Eu era, nessa altura, além de jornalista, cantor político, e tinha muito orgulho nisso. Depois de oferecer exemplares do livro a amigos e camaradas de redação como Álvaro Guerra, Fernando Assis Pacheco ou Miguel Serrano, entre outros, guardei um, muito especial, para José Afonso, que me deu um abraço e me dirigiu este comentário, depois de folhear o livro: «Isto é outra coisa, é outra linguagem, mas também és tu.» E era verdade. A linguagem era muito diferente, mais intimista e elaborada, mas o autor era, no essencial, o mesmo das canções. Eu nunca mostrara ao Zeca esses poemas.

Foi antes do 25 de Abril…

Em Janeiro de 1973. Nesse ano, em finais de Abril, Zeca Afonso foi preso pela PIDE em Caxias e lá escreveu e me dedicou o poema "Ao Zé Letria Que Também Sofre de Azia". Quando penso nesse livro de estreia, lembro-me sempre dele e desse dia que a memória não consentiu que se apagasse. A nossa resistência generosa e firme era também ato poético que diariamente se renovava. Ainda tenho saudades desse dia.

Depois de morrer tanto «em tantas mortes», como diz no livro Adivinhação do Azul, o que vale ainda a pena viver?

Vale sempre a pena viver, nem que seja para escrever sobre o vazio das mortes que nos empobreceram e deixaram mais sozinhos. Pessoa dizia que viajar é perder países. Eu atrevo-me a dizer que envelhecer é perder amigos e raízes. Em Agosto partiu a minha mãe e eu senti que a maior de todas as raízes me tinha sido arrancada, a que verdadeiramente nos liga à terra e à memória profunda. Na verdade, na poesia e fora dela, o que a vida nos proporciona é esse «um pouco mais de luz» que Goethe pedia quase na hora da partida.

Que tempo é hoje o do ser humano?

É, infelizmente, um tempo desumanizado pelo estabelecimento de prioridades equívocas, um tempo aviltado pela ilusão de que a materialidade dos bens de consumo representava (ou representa) a verdadeira liberdade e a verdadeira independência.

Bateu-se no fundo?…

A evidência da realidade forçou-nos a bater no fundo, dolorosamente, e, talvez por isso, consigamos perceber que nos falta o tempo para termos tempo, o tempo para olhar, para fruir, para partilhar e para amar. E também nos falta o bálsamo libertador da poesia. Theodor Adorno escreveu que depois de Auschwitz não mais seria possível escrever poesia. Eu diria que depois do 11 de Setembro, do colapso dos mercados e em pleno tempo de terrorismo financeiro praticado pelos mercados desregulados e pelas suas agências de "rating", nunca a poesia nos fez tanta falta para nos reencontrarmos com a espiritualidade mais profunda da palavra em todos os seus sons e sentidos.

Tem muitos inéditos em repouso?

Como nunca parei de escrever, apesar da crescente dificuldade de se editar poesia em Portugal, por não ser "objecto" do agrado dos "gestores de produto" que pontificam nas editoras, claro que tenho inéditos.

Pois bem: dê-nos um… ou dois, como prenda de aniversário…

Aqui vão. Aproveito para agradecer à Imprensa da Universidade de Coimbra o privilégio que me deu de apostar na edição desta antologia e à Teresa Carvalho, doutoranda da Faculdade de Letras daquela universidade, o trabalho que realizou como antologiadora e que muito me honra. É uma forma que me agrada de, sem alarido, assinalar a passagem destas quatro décadas de trabalho poético.


Dois Poemas Inéditos de José Jorge Letria





MARÇO DE 2013





EDITE ESTEVES  DO JORNALISMO À ARTE POÉTICA


helena matos Sempre que se falar do jornalismo português, o nome de Edite Esteves é obrigatório que seja nomeado na primeira linha e em caixa alta. Porque o seu profissionalismo o merece; porque assim devem ser justiçados o modo culto, exigente consigo mesma, a ética e o rigor que são a bússola. A par da sua brilhante carreira nos jornais, cabe também realçar a mulher que tão sabiamente cultiva a arte poética. É com especial carinho que a temos neste sítio de encontro e de partilha com o inédito «Se Metade de Mim For Água», um poema de excelência no ritmo, na melodia, na interação do Eu com elementos primordiais.



MARÇO DE 2013






MANUEL MONTEIRO  OS DEZ MANDAMENTOS DO ESCRITOR


helena matos Venceu recentemente o prémio Novos Talentos FNAC Literatura que lhe proporcionou um merecidíssimo palco mediático. Manuel Monteiro é o nosso mais jovem Convidado desde o começo, há perto de dois anos, deste sítio de encontro e de partilha. Poderá estranhar-se que um recém-chegado à criação literária produza um texto com o título "Os Dez Mandamentos do Escritor".
A verdade é que as reflexões de Manuel Monteiro sobre a aparentemente insondável arte literária são de uma profundidade e ponderação imensas. Revelam uma perceção analítica, lúcida e culta, que os profissionais da escrita não deixarão de apreciar. Os escritores que se cuidem. Os leitores exigentes destes DEZ MANDAMENTOS deixarão de ser benevolentes para com os pecadores...





Aproveitamos a oportunidade para analisar não só o último livro de Manuel Monteiro ("O Suave e o Negro") mas também a singular individualidade profissional do autor. A crónica de Pedro Foyos tem um título aparentemente excêntrico (mas de imediato se intui o fundamento): "Manuel Monteiro e a Literatura nos Cuidados Intensivos da Gramatologia". Na sequência deste texto louvamos os escritores portugueses que têm vindo a assumir-se como autênticos socorristas das palavras em vias de extinção. Realçamos nessa crónica ("Em louvor dos socorristas das palavras em vias de extinção") um queridíssimo amigo, Baptista-Bastos, heróico combatente de ideias e de causas, que neste momento enfrenta bravamente, num hospital, uma preocupante adversidade.



FEVEREIRO DE 2013






BIODIVERSIDADE E GEODIVERSIDADE
ANÁLISE DO PROF. GALOPIM DE CARVALHO A UM
CONCEITO DE QUE POUCO SE FALA


De biodiversidade viva, ou seja, do conjunto das espécies biológicas que povoam o nosso mundo, não só falam muito e bem, biólogos e ambientalistas, como políticos, uns com propósitos sérios e outros não tanto assim, e cidadãos esclarecidos. O mesmo não acontece com a geodiversidade de que pouca gente fala e que, não é demais lembrar, constitui o suporte da biodiversidade, seja na superfície do planeta, seja nas profundezas oceânica onde ecossistemas muito particulares vieram revolucionar as nossas ideias sobre a origem da vida. Assim, sem deixar de falar em biodiversidade, é preciso dar à geodiversidade a importância que ela tem na sociedade.

TEXTO INTEGRAL




                 NOVO LIVRO DE GALOPIM DE CARVALHO: "ERA UMA VEZ...
                 COM CIÊNCIA"


Todas iniciadas pela tradicional "Era uma vez…", as sete histórias que integram o livro agora editado pela Âncora, utilizam a ficção, ao estilo dos contos infanto-juvenis, falam com simplicidade, mas sem perda de rigor científico, de temas de geologia, mineralogia e paleontologia, de grande utilidade no dia-a-dia do cidadão.
Galopim de Carvalho escreve, desta vez e em especial para os mais jovens, numa linguagem que não desmerece os mais crescidos, interessados em ler o que se procura ensinar. Francisco Bilou assina a ilustração.
Sugerimos vivamente a leitura deste novo livro de Galopim de Carvalho, emérito professor e amigo que tanto admiramos.

JANEIRO DE 2013






ANTUNES DA SILVA  A BUSCA IMPOSSÍVEL DE UM SINÓNIMO PARA "LIBERDADE"


helena matos Na ocasião em que se cumprem os quinze anos da morte do escritor Antunes da Silva, esquecidíssimo nome do movimento neorrealista português, evocamos um episódio decorrente de uma proibição censória. A palavra "liberdade" não poderia figurar no texto e muito menos no título de uma entrevista que lhe fizemos nos anos 60.

A história tornou-se bizarra quando os jornalistas, na Redação, observaram que o diligente censor tomara a iniciativa de substituir "liberdade" por uma expressão inconcebível, hipoteticamente interpretando de forma mais decorosa o sentido da declaração do entrevistado.

O relato causará assombro aos nossos leitores que por felicidade já cresceram em democracia. A esses, em especial, será importante realçar que este caso e inúmeros outros não ocorreram há séculos. Apenas há 40 ou 50 anos. Estão vivos muitos dos protagonistas: os oprimidos e também, naturalmente, os opressores...

Na oportunidade desta evocação do pintor-poeta recordamos uma obra admirável de Maria João Fernandes: Um Destino Solar é o título desse livro de 2004 que conjuga ensaio, criatividade, afetos, deslumbramentos e memórias que não desistimos de proteger.



JANEIRO DE 2013






JULIO / SAÚL DIAS, O PINTOR-POETA
UMA 'GRANDE FÚRIA' DE VALTER HUGO MÃE CONTRA A 'DESMEMÓRIA'


helena matos Fazemos ecoar com não menos indignação o brado de revolta de um querido amigo, o escritor Valter Hugo Mãe, contra a 'desmemória' infligida a Julio / Saúl Dias, o pintor-poeta. Numa crónica de 'grande fúria' publicada no Jornal de Letras, Valter Hugo Mãe manifesta-se vigorosamente contra a política de cultura que sepulta não só a memória dos nossos maiores artistas mas também nos empobrece a todos ao desprezar os valiosos espólios que os mesmos deixaram. No caso de Julio / Saúl Dias sabe-se do sonho em preservar numa casa-museu o seu impressionante património cultural. Todavia, desde os anos 80 (!) que o filho, recém-falecido, reclamava o cumprimento de promessas por parte da Câmara Municipal de Vila do Conde. Trinta anos a implorar, pelo pai, pela cultura, por nós. Uma luta inglória. Agora tudo irá dispersar-se. Compreende-se o tumulto emocional que ressalta de cada linha da crónica de Valter Hugo Mãe, da qual transcrevemos alguns trechos significativos.

Na oportunidade desta evocação do pintor-poeta recordamos uma obra admirável de Maria João Fernandes: Um Destino Solar é o título desse livro de 2004 que conjuga ensaio, criatividade, afetos, deslumbramentos e memórias que não desistimos de proteger.



JANEIRO DE 2013






GRAÇA PIRES  A MATURIDADE PLENA


helena matos De uma dúzia de livros publicados entre 1990 e 2011, Graça Pires editou recentemente Poemas Escolhidos, uma antologia organizada pela autora que nos diz em nota de abertura: «Não foi fácil a escolha. Não pretendi questionar-me ou questionar alguém sobre a emoção e a sensibilidade que a poesia reclama. Escolhi aqueles poemas onde o meu olhar se deteve mais tempo ou se sobressaltou com as palavras escritas».

Graça Pires tem uma poética de invulgar sensibilidade, recusando sempre a facilidade. Em cada verso alcança a unidade perfeita entre o Ser total e o jogo magnífico das metáforas, da significação. Nesta relação com a imagética, a autora não recorre a figuras de estilo pomposas e vazias. Pelo contrário, há na sua lírica uma infinita preocupação com as palavras, depurando o poema até este ser uma luz natural, profunda, espelhando uma autenticidade que constrói a grande partilha de afetos e reflexões.

TEXTO INTEGRAL



JANEIRO DE 2013